Na entrada do Parque da Água Branca, em Perdizes, placas oficiais anunciam "Restauro e Reforma de Prédios". Quem o adentra depara-se, no entanto, com uma radical alteração de sua concepção paisagística e sociocultural que está apagando suas características de um ímpar espaço de lazer e fruição da natureza.
A vegetação rasteira que atapetava as árvores frondosas, cada dia menos numerosas, foi extraída e substituída, em larga escala, por pedregulhos. Corre-se assim o risco de abalar seu ecossistema, bloqueando a reprodução dos resquícios de mata atlântica que ainda são o principal atrativo do Parque. De saída, essa urbanização forçada, imitação dos espaços de lazer de condomínios, suprimiu o habitat de galinhas, gansos, pavões, gatos e micos que perambulavam livremente e davam ao Parque um charme diferencial todo próprio.
Os espaços passaram a ser rigidamente compartimentados e controlados. Em diversos ambientes ao ar livre agora é proibido comer. Namorados são instruídos a evitar abraços e beijos. Na praça dos idosos só podem permanecer os que têm mais de 60 anos, vetando-se a amigável convivência entre as diversas faixas etárias. A ampliação generalizada de lugares exclusivamente destinados a exercícios físicos está transformando o Parque em uma academia a céu aberto.
Abrigo da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo e de uma concorrida feira de produtos orgânicos, o Parque, fundado em 1929, sediou exposições agropecuárias até fins da década de 1970. Desde suas origens, sempre dividiu seus espaços entre o desenvolvimento de pesquisas agropecuárias e o lazer.
As reformas, assim como a domesticação da mata, realizam, no entanto, um ideal de assepsia que parece não levar em conta nem a história do local, nem as necessidades de seus usuários ou dos moradores da região. Muitos entre seus freqüentadores habituais sentem-se pouco confortáveis com essa higienização da natureza e do ambiente cultural.
Este sentimento foi reforçado pela suspensão do "Revelando São Paulo", uma exposição que trazia anualmente para o centro do mundo urbano as tradições caipiras e as culturas rurais remanescentes de todas as regiões do Estado. Em reuniões com os usuários, os responsáveis pelas reformas informaram que projetam instalar na Casa do Caboclo – ponto de violeiros e da disputada cavaca, com paredes de taipa e chão de terra batida – jardins e pisos sextavados.
Realiza-se assim uma desruralização do Parque, promovendo uma racionalização dos espaços que diminui as oportunidades de convívio com a natureza, reforçando ainda mais a cultura do cimento e do concreto na cidade de São Paulo.
Adma Muhana
Cilaine Alves Cunha
Ricardo Musse
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